Nove semanas
Quando estávamos no mais duro da quarentena aqui na Espanha, sonhávamos com tudo que faríamos quando ela acabasse. Todos os abraços, os reencontros, as viagens, os trabalhos que voltariam. Existia a fantasia de que quando tudo acabasse, realmente terminaria. O presidente anunciaria na tv que agora já estaríamos livres do vírus e abríamos as portas e voltaríamos para a vida. Mas até a descoberta de uma vacina, isto não será possível. Vamos saindo, mas é pouco a pouco. Bem pouco a pouco. O que às vezes gera situações estranhas e muita frustração.
Levamos os meninos para ver aos avós depois de dois meses de isolamento. Zaragoza está na fase 1 da desescalada do confinamento. Serão 4 fases no total. Em cada uma delas, se permitirá fazer mais coisas. Como mínimo, de uma fase para outra serao necessários 15 dias. Quer dizer, até o final de junho conviveremos com muitas restrições.
As visitas de um máximo de 10 pessoas estão permitidas nesta fase (fico pensando se a polícia vai tocar na nossa porta para contar quantos somos, enfim…) Quando falei para os meninos que iríamos na casa dos avós, eles pularam de alegria. Imaginaram que seria como sempre: os avós lhes perseguiriam pelo corredor para dar lhes um beijo. Uma brincadeira que fazem desde pequenos. Depois a avó prepararia a merenda e seguiriam com algum jogo de tabuleiro. Terminariam deitados no sofá, vendo algum desenho na tv. Mas não foi nada disto que aconteceu.
Os avós, embora saudáveis, fazem parte da população de risco. Não podemos arriscar a um contágio, sem saber se somos portadores assintomáticos do Coronavírus. A visita não durou mais de 10 minutos. Todos de máscara. Os meninos não sentaram, nem tocaram nada. Não houve abraços, nem beijos. Não houve merenda, nem jogo. Foi bom ver, mas foi um pouco frustrante para todo mundo. Esta sensação será constante neste período. Não há saída mágica. Vai ser pouco a pouco.
Agora estamos na expectativa da escola voltar ou não. Todos queremos que volte. Mas nas mensagens que recebemos do Ministério da Educação espanhol vemos que o caminho será o do “quero, mas não posso”. Classes com metade dos alunos, recreios em horas separadas, parte das classes on line, desinfecção das instalações não sei quantas vezes por dia, tentar impedir que as crianças se toquem, máscaras na sala de aula e um longo etc.
Estamos em uma zona de equilíbrio muito frágil. Onde o final ainda está longe e a qualquer momento podemos dar um passo atrás. Esta “nova normalidade” tem muito pouco de normal. Teremos que aprender em tempo record a conviver de outra forma até que o medo e a insegurança desapareçam.
Que aprendizado podemos fazer de tudo isto? Tento ser otimista e pensar que para a escola poderia ser um oportunidade. Mais trabalhos para investigar e menos memorização, trabalhar em grupos, outros tipos de avaliação… que as crianças tivessem mais tempo para aprender de um modo mais criativo. Mas criança também precisa dos amigos, do esporte coletivo, da convivência. Isto não sei quando terá solução. Queremos, mas ainda não podemos.
Enquanto isto, quem mora fora vê o Brasil com enorme angustia. Preocupados com a família e amigos, sem saber quando poderemos ir. O tsunami chegou na costa brasileira. Se protejam, que ele passa. Mas não tem saída mágica. Na verdade, a saída é estreita e lenta. Mas vamos saindo, um passo de cada vez.