Outros bichos.
Tem coisa quando você decide morar fora, que é difícil que alguém te conte. Até por bondade, porque já é tanto o que você vai encarar, que a intenção é não transformar a aventura num filme de terror. Uma das coisas que me dei conta que geralmente não falo, é que talvez o que mais padeça no processo de adaptação seja o seu corpo . Não é porque você chegou a um lugar super a fim que a experiência seja fantástica, que você não vai passar por uma aclimatação danada. Isso não depende de seu querer , mas do seu sistema imunológico, de seu relógio biológico, da história registrada no seu corpo pelo ambiente. Somos animais , e como qualquer outro animal, quando chegamos a um bioma diferente, nossa máquina que estava habituada a funcionar com determinados recursos, leva um tempo para funcionar perfeitamente com outros recursos. Lembra das teorias da evolução, que Darwin defendia que o ser mais forte é aquele que se adapta mais facilmente? Então, prepare-se, porque a capacidade de adaptação de seu corpo vai ser colocada à prova durante um tempo.
Tem bichos novos para todos, doidinhos para encontrar um sistema imunológico desavisado: para garganta, para o pulmão, para a barriga, para a pele, para o ouvido… geralmente o foco em que esses seres mais se manifestam coincidem com nossos pontos frágeis. São uns oportunistas, são sim, para não dizer algo pior.
Não adianta, você vai passar por esse processo, pelo menos enquanto seu corpo não for capaz de reconhecer os diferentes, e armar seu exército.
Foi assim em Madrid, todo mundo dizia que quando chegasse a primavera iríamos sofrer com o pólen. A alérgica mor de plantão aqui , ao ouvir isso, já logo pediu reforço para a família do Brasil mandar caixas de antialérgico. A primeira primavera passou e nada aconteceu. Eu já contava vitória contra o pólen, mas quem imagina que acaba assim, se engana . Chegou a segunda primavera, e o corpitcho dessa pessoa já conhecia o tal do pólen, e tinha péssimas referências registradas. Pólen tornou-se inimigo. Imagine três meses como a rena do nariz vermelho, de olhos inchados e tudo coçando. Sobrevivi, a base do santo reforço da muamba familiar de antialérgico.
O segundo episódio da série adaptação animal familiar na nossa história aconteceu em Milão. No final do ano , Lucca estava gripado constantemente, se sentia cansado, sem energia. Na nossa ida para o Brasil, fomos à pediatra que pediu todos os exames dele. Resultado: Vitamina D baixa, ferro baixo. Aí estava a explicação para as defesas também baixas. Milão tinha menos sol que em Madrid, e foi a primeira vez que sentimos os efeitos da falta que o astro rei faz para os seres tropicais. Com a ajuda das vitaminas e mudanças na alimentação, orientada por uma nutricionista, conseguimos corrigir a carência.
Aqui em Londres eu quis ser mais esperta, e fiquei de olho nas minhas plantas para tentar entender os ciclos e bio-ritmos… Doce ilusão. O coitado do meu limoeiro não deu um limão no ano passado, e meu jasmim pirou. Esse ano o limão anuncia tímidos exemplares, e o jasmim está florescendo só agora, na entrada do outono. Então , imagina o que acontece com a gente? Eu, que achava que já tinha tido todas as gripes do continente , chegando aqui sofri pra dedéu. Passei mais tempo do que queria na cama, saindo de um resfriado e entrando em outro ainda mais forte. Mas aprendi, com a melhor fonte: amigos veteranos do país. Leticia, amiga querida de longa data , que temos a sorte de morar por essas bandas há quase 5 anos, deu a dica preciosa. Anota aí você também que vive em Londres ou em um país mais ao norte: durante o ano todo 1mg de vitamina C todos os dias, e quando chega o outono inclua vitamina D diariamente . Isso não garante que você não vai se contaminar ( na minha opinião, melhor que se contamine, assim fica resistente logo), mas ajuda a não te derrubar a cada novo micro-organismo que invade o seu espaço íntimo e pessoal.
A menos que você seja um interessado em microbiologia, infectologia, ou fisiologia, e pretenda fazer de seu corpo um laboratório de estudos, sugiro que converse muito com amigos que vivem no país há mais tempo, e se prepare. Se não dá para remediar, pelo menos se fortaleça para essa mudança. Assim fica mais fácil viver e conviver em certa paz e harmonia com todas as espécies vivas do seu novo meio ambiente.